Adélia Prado: diferenças entre revisões

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[[w:Adélia Prado|'''Adélia''' Luzia '''Prado''' Freitas]] (nasceu dia 13 de dezembro de 1935, em Divinópolis, Minas Gerais, Brasil); professora e escritora.
{{Wikipédia}}
'''Com licença poética'''



Quando nasci um anjo esbelto,

desses que tocam trombeta, anunciou:

vai carregar bandeira.

Cargo muito pesado pra mulher,

esta espécie ainda envergonhada.

Aceito os subterfúgios que me cabem,

sem precisar mentir.

Não tão feia que não possa casar,

acho o Rio de Janeiro uma beleza e

ora sim, ora não, creio em parto sem dor.

Mas, o que sinto escrevo. Cumpro a sina.

Inauguro linhagens, fundo reinos
(dor não é amargura).

Minha tristeza não tem pedigree,

já a minha vontade de alegria,

sua raiz vai ao meu mil avô.

Vai ser coxo na vida, é maldição pra homem.

Mulher é desdobrável. Eu sou.



----

'''Dia'''



As galinhas com susto abrem o bico

e param daquele jeito imóvel

- ia dizer imoral –

as barbelas e as cristas envermelhadas,

só as artérias palpitando no pescoço.

Uma mulher espantada com sexo:

mas gostando muito.


----

'''Exausto'''


Eu quero uma licença de dormir,

perdão pra descansar horas a fio,

sem ao menos sonhar

a leve palha de um pequeno sonho.

Quero o que antes da vida

foi o sono profundo das espécies,

a graça de um estado.

Semente.

Muito mais que raízes.



(in "Bagagem" São Paulo: Ed.Siciliano, 1993)


----
----


=='''Com licença poética'''==


:Quando nasci um anjo esbelto,
'''Ensinamento'''
:desses que tocam trombeta, anunciou:
:vai carregar bandeira.
:Cargo muito pesado pra mulher,
:esta espécie ainda envergonhada.
:Aceito os subterfúgios que me cabem,
:sem precisar mentir.
:Não tão feia que não possa casar,
:acho o Rio de Janeiro uma beleza e
:ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
:Mas, o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
:Inauguro linhagens, fundo reinos
:(dor não é amargura).
:Minha tristeza não tem pedigree,
:já a minha vontade de alegria,
:sua raiz vai ao meu mil avô.
:Vai ser coxo na vida, é maldição pra homem.
:Mulher é desdobrável. Eu sou.




=='''Dia'''==
Minha mãe achava estudo


:As galinhas com susto abrem o bico
a coisa mais fina do mundo.
:e param daquele jeito imóvel
:- ia dizer imoral –
:as barbelas e as cristas envermelhadas,
:só as artérias palpitando no pescoço.
:Uma mulher espantada com sexo:
:mas gostando muito.


Não é.


=='''Exausto'''==
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.


:Eu quero uma licença de dormir,
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
:perdão pra descansar horas a fio,
:sem ao menos sonhar
:a leve palha de um pequeno sonho.
:Quero o que antes da vida
:foi o sono profundo das espécies,
:a graça de um estado.
:Semente.
:Muito mais que raízes.
::- ''(in "Bagagem" São Paulo: Ed.Siciliano, 1993)''


ela falou comigo:


=='''Ensinamento''' ==
"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.


:Minha mãe achava estudo
Não me falou em amor.
:a coisa mais fina do mundo.
:Não é.
:A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
:Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
:ela falou comigo:
:"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
:Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.
:Não me falou em amor.
:Essa palavra de luxo.


[[categoria:poetas do Brasil]]
Essa palavra de luxo.
[[categoria:professores do Brasil]]

Revisão das 18h17min de 1 de dezembro de 2005

Adélia Luzia Prado Freitas (nasceu dia 13 de dezembro de 1935, em Divinópolis, Minas Gerais, Brasil); professora e escritora.


Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas, o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
(dor não é amargura).
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida, é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.


Dia

As galinhas com susto abrem o bico
e param daquele jeito imóvel
- ia dizer imoral –
as barbelas e as cristas envermelhadas,
só as artérias palpitando no pescoço.
Uma mulher espantada com sexo:
mas gostando muito.


Exausto

Eu quero uma licença de dormir,
perdão pra descansar horas a fio,
sem ao menos sonhar
a leve palha de um pequeno sonho.
Quero o que antes da vida
foi o sono profundo das espécies,
a graça de um estado.
Semente.
Muito mais que raízes.
- (in "Bagagem" São Paulo: Ed.Siciliano, 1993)


Ensinamento

Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.